quinta-feira, 3 de outubro de 2013


TI ZÉ DA BARRUSSA
 

     Teve taberna na Mata, ao cimo da rua de Entre Bairros e sempre gozou da estima da clientela mais nova. Ti Zé da Barrussa tinha um certo jeito para lidar com infantes e jovens. Dava-se ao respeito e era respeitado.

     A taberna tinha dois compartimentos acanhados, onde se jogava às cartas, mas que serviam amiúde para as patuscadas da juventude. E uma dessas patuscadas era comer peixe do Ponsul ou da ribeira de Alpreade, apanhado à mão, e que a Ti Luísa estripava e fritava para a rapaziada. Inda os fritos não faziam mal a ninguém, nem o toucinho salgado, nem o presunto, nem o chouriço. Tão-pouco o vinho do barril.

     Os fregueses – cliente era uma palavra inexistente no vocabulário dos habitantes da Mata – ao entrar deparavam imediatamente com Ti Zé da Barrussa para lá do balcão, quase sempre em movimento naquele espaço exígua de dois ou três metros quadrados, onde tinha barris e garrafões, o asado e um alguidar com água, onde os copos eram passados para servirem logo a seguir.

     Era um homem calmo com uma calva respeitável. No Verão, usava camisa branca e ali estava quase todo o dia, assistindo serenamente às brincadeiras e graçolas dos mais novos e também às discussões e madurezas dos mais velhos, rapazes e homens de todas as idades, que mulheres e raparigas não entravam nas tabernas. Ouvia mais do que falava.

     A taberna não era a sua única ocupação. Também tratava dos seus pedaços de terra e nas estações mais frias trabalhava por conta de outrem. Se a memória não me falha, creio que chegou a ser capataz de fega, ou seja, encarregado. O capataz apontava as faltas e servia também de relógio, pois competia-lhe mandar almoçar, pegar e largar o trabalho. Usava uma vara comprida, que lhe permitia colher uma azeitona que ficasse na oliveira por um motivo qualquer. E usaria também um apito de madeira, idêntico ao dos árbitros de futebol, a fim de marcar os já referidos tempos.

     Dei-me sempre bem com Ti Zé da Barrussa, que me tratava cordialmente, pois era seu timbre tratar toda a gente com bons modos. Certa noite, eu e o João Maria éramos já os únicos clientes, mas não estávamos muito dispostos a arredar pé. Ti Zé da Barrussa, calmamente, disse-nos então: “Ó cachopos, está na hora! Eu deixo-vos uma grade de cervejas e podeis ficar aí no poial até quererdes”. E assim foi. Ficámos até de madrugada, bebendo e conversando.

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