domingo, 18 de agosto de 2013


TI MANEL JAPONA

 


          Falava quase sempre num tom baixo e pontuava a conversa com notas de humor – ou, de sarcasmo, às vezes -, que nem sempre agradavam aos interlocutores. Manuel Domingos Barata, filho de Joaquim Domingos e Joana Barata, era primo direito de meu pai. Apesar de primos, tinham os seus conflitos, mais ou menos longos; porém, acabavam sempre por se reconciliar.

     Ti Manuel Domingos, a alcunha não era usada na sua presença, foi dos primeiros proprietários de uma motorizada, na nossa freguesia, que lhe conferia um estatuto, não sei bem precisar do quê, mas, no mínimo, de possuidor de uma motorizada. Exerceu a profissão de pedreiro e chegou a ser pequeno empreiteiro. Mas o seu feito maior foi ter ousado abrir o primeiro café da Mata, que teve para a nossa terra a importância que o “Florian” ou a “Lavena” terão tido para Veneza. E quase coincidentemente com a advento da televisão em Portugal.

     O café do primo Japona era um espectáculo: tinha mesas e cadeiras, televisão e uma freguesia ruidosa e divertida. Foi neste café de aldeia que vi as primeiras e inesquecíveis séries, nomeadamente o Bonanza, aos sábados à noite, o Rim-Tim-Tim e o Zorro, noutros dias da semana. Também o Mr. Ed, ou seja, o cavalo que falava, mas muito mais interessante que certas cavalgaduras que actualmente ocupam espaço televisivo. E ainda o humor que se ia fazendo e as variedades. Ah, ainda me recordo do Camilo de Oliveira quase novinho em folha!

     Depois foi a emigração, onde nos encontramos todos, em Sceaux. Lembro-me perfeitamente de ter ido à rua de Vaugirard, em Paris, onde havia uma dependência do ministério do trabalho, levantar-lhe a carta de trabalho. Coisa de pouca monta, mas que calou fundo neste carácter habitualmente fechado, que deixava sair, amiúde, uma graça, um dito jocoso, uma pergunta pertinente. Creio que foi comigo e com os meus pais ao 29º Salon de L’aéronautique du Bourget, onde, também eu havia de ver, pela primeira e última vez, solo lunar.

     Regressado de França, reabriu o café e por ali permaneceu até ao fim. A nossa amizade nunca conheceu altos e baixos, porque, antes de mais, nos respeitámos sempre mutuamente. O meu pai chegava sempre apressado, quando íamos tomar café. O primo Manel Japona estendia-me a mão, e perguntava: “Tás cá? Tás bom?” Aviava os cafés e perguntava à minha filha:” E tu Filipa, o que queres?”. Normalmente queria uns chocolates (táxi), de qualidade duvidosa, que se comercializavam nos cafés de aldeia. Por vezes dava-lhe um chocolate, sem nada perguntar e dizia: ”Este sou eu que to dou”.

     E por ali ficou, até ao fim, perseverando no trabalho do café e no amanho das suas terras. O café, ainda hoje, em sua memória, é o café BARATA.

   

 

    

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