quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

 TI MNECAS




      Era um homem de estatura mediana, bem-disposto e cheio de energia. Possuía junta de vacas e gado ovino, que lhe conferia um estatuto de lavrador próspero. Dava trabalho a homens e mulheres da aldeia e não se esquecia dos familiares, que também tinham de fazer pela vida.
     Tinha uma tapada perto da nossa casa, ou melhor dizendo, no seguimento da nossa rua, onde tinha uma nora e muitas árvores de fruto. Lembro-me de duas figueiras enormes, conhecidas por figueiras estivais, que davam figos de S. João e da vindima, grandes e saborosos. Lembro-me também do alvanel através do qual se drenavam as águas, quando o Outono e o Inverno vinham mais chuvosos. Notava-se bem que havia por ali saber e fartura.
     De imaginação muito irrequieta, lembrou-se de fazer na propriedade uma enorme represa, a que nós chamávamos barragem, que permitia abundância de água para regar as árvores e as culturas serôdias. Foram dois dias de escavadora de lagartas, a que toda a gente chamava “caterpillar.
     E ali ficou um depósito de água de grandes dimensões, com nascente, e um montão de terra enorme. E tudo aquilo era muito giro, ou deveria ser, porque atraiu ao local muitas dezenas de adultos e crianças, que nunca tinham visto uma máquina tão trabalhadora.
     Ti Mnecas, lavrador com terrenos próprios e arrendados, tinha uma apreciável produção de trigo. Daí que na sua eira, a pouco mais de cem metros do cemitério da aldeia, todos os anos vinha a malhadeira, que era o nome que a debulhadora tinha na Mata, que operava o milagre de transformar os enormes rolheiros de trigo, ceifado por homens e mulheres, em semente pronta a moer e palha. Quando a malhadeira roncava na eira de Ti Mnecas, era grande a azáfama dos trabalhadores e a curiosidade da pequenada.
     Mais tarde, quando a lavoura se tornou pouco produtiva, Ti Mnecas ainda foi dono de uma carroça e de um macho, fazendo o transporte de pessoas da Mata para Castelo Branco e de Castelo Branco para a Mata, substituindo-se aos caros táxis, que as pessoas não podiam pagar.
     Era bom homem. E talvez por isso, não tenha tido vida longa. É que esta está reservada àqueles diabos que normalmente só sabem infernizar a vida dos outros. Ti Mnecas era empreendedor, como agora se diz, e deu pão a ganhar a muita gente.

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