terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Deus et pulvis 

                         A António Salvado 

Nascera pedra. Bloco na montanha,
Viveria, imortal, no seu recanto,
Crestado pelo Sol, lavado em pranto
De tempestade e orvalho, exposto à sanha

De ventos que lhe davam voz e encanto.
Eis senão quando vem o homem, lanha-
Lhe o dorso inerme e o leva a terra estranha
Onde um artista, pra seu grande espanto

Esculpe um deus grandioso e venerado.
Entanto, pouco, na divina casta
Viveu, porque, cumprindo-se o seu fado,

Em nome da razão, o templo invade
A fúria insana de um iconoclasta -
Desfez-se em pó sua imortalidade.

Wagner, Ribeiro, Sonetos, Aracaju-SE, ed. do autor,  2012

Nota: Este poeta brasileiro, para mim desconhecido até ontem, tem cul-
tivado o soneto, género poético muito propício à reflexão. Mão amiga
fez-me chegar Sonetos e A angústia de Zeus. Para espanto meu, em
Sonetos aparece um, o que acima transcrevi, dedicado ao grande poeta
português António Salvado, de Castelo Branco, que é um generoso amigo. 

Sem comentários:

Enviar um comentário