TI
ZÉ JÚLIO
Era um homem baixo e cheio, que recordo a
varrer a rua à frente da sua casa, a rua de Santa Margarida, que começa junto à
igreja matriz e termina no Largo do Prata. Usava uma vassoura de giestas quase
da sua altura. Não era homem de tabernas. Apreciava mais sentar-se no seu poial
a descansar e a ver quem passava. Era um homem bom.
Dele se conta uma história engraçada, cuja
veracidade jamais poderei apurar. E que aqui deixo em pinceladas rápidas, que
rápidas quero estas minhas narrativas sobre pessoas da Mata. Esta história terá
ocorrido há mais de cinquenta anos, na segunda-feira de Pascoela, que era
também o dia principal da festa de S. Pedro. O padre percorria a aldeia,
entrava nas casas, dava o Cristo crucificado a beijar e desejava as boas-festas
aos moradores e seus paroquianos.
Um dos organizadores deste cerimonial era
o professor Falcão, que, naquele ano, decidiu com o padre, ou sozinho que é a
mesma coisa, que o padre com o crucifixo só entrava nas casas dos paroquianos
que tinham a côngrua paga. Quando se chegou à porta de Ti Zé Júlio, o professor
Falcão sentenciou: “O Zé Júlio, não pagaste a côngrua e, por isso, o nosso
senhor não entra na tua casa”.
Ti Zé Júlio, despachado, foi buscar
dinheiro e perguntou: ”Quanto é que eu devo, senhor professor?”. O professor
consultou a relação e lá disse quanto era. Ti Zé Júlio pagou e quando se ia
afastar, o professor disse-lhe:” Agora, o nosso Senhor já pode entrar na tua
casa, Zé!”, ao que Ti Zé Júlio respondeu com prontidão: ”Não, senhor professor.
O nosso Senhor não entra na minha casa, porque eu não quero. O nosso Senhor não
é de vinganças”.
E foi assim que Ti Zé Júlio, que usava o
chapéu sempre inclinado para trás, deu ao professor, ao abade e restante
séquito, uma grande lição. Ah, como eu gostava de ter visto a cara do professor
Falcão!
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