TI
ZÉ BALHAU
Ti
Zé Balhau, ou ti Zé Balhau Chichinha, é uma e a mesma pessoa. Surdo que nem uma
porta era desconfiado como todos os surdos, mas nem por isso deixava de ser uma
pessoa popular e divertida. Ainda joguei muitas tardes com este antigo comerciante
e industrial, quando ele já ia nos oitenta. Teria hoje, feitas as contas por
alto, cerca de cento e trinta anos.
Quando o conheci, ou melhor dizendo,
quando me dei conta da sua existência, só bebia cerveja, muita cerveja, que era
a bebida da sua predilecção. No entanto, dizia-se que bebera muito vinho e
muita aguardente. Seja como for, tinha, já avançado na idade, uma destreza
mental e física que faziam inveja a gente muito mais nova.
Andava sempre de casaco e colete – e também
o inevitável chapéu-, mesmo nos dias quentes de verão, porque, dizia, o que
tapa o frio também tapa o calor. Quem o quisesse ver era no café do Prata, que
depois foi do Bicho, seguidamente do Zé Isidoro e mais tarde do Manel Sapateiro,
até fechar as portas. Não sei ao certo como foi o fim de Ti Zé Balhau, mas o
nosso homem terá chegado aos noventa.
O seu jogo preferido, e creio que único,
era a bisca de três. E jogava de tal modo bem, que, ganhar-lhe, era proeza de
monta. E como ganhava e bebia todas as partidas jogadas, imagine caro leitor, a
quantidade de cervejas médias diárias que o nosso ancião escondia por debaixo
da camisa. E ria, ria, gozando por ganhar e por os outros terem de pagar a
cerveja. Diga-se, no entanto, que quando perdia, nunca se recusava a pagar.
Homem de muitos negócios, foi proprietário
de um lagar de azeite, de varas, puxado por uma junta de machos. Era pegado ao
forno que foi do professor falcão, que ainda lá está, e lembro-me de ter estado
no seu interior antes da demolição. Há muitos anos, claro. Apesar de ter vários
filhos e muitos netos, Ti Zé Balhau foi um homem muito independente e com
ideias próprias.
No final da vida, com o aparecimento das
máquinas de café, procedeu à substituição da loira cerveja pela bebida negra. E
creio que terá sido o café que acelerou o seu perecimento.
Deixou o seu nome associado à expressão: “Chichinha
Zé Balhau da Mata”. Diz-se, localmente, ou dizia-se, para designar uma coisa
boa ou algo que cai bem.
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