sábado, 30 de novembro de 2013

A JULGAR O POBREZINHO


 
 

Wikipédia

A julgar o pobrezinho

A justiça é pressurosa;

Porém, quando julga o rico,

É muito lenta e manhosa.

 
Já não falo dos políticos

E outros senhores do mando.

Ficam quase sempre impunes

Seja qual for o desmando.
 
 

A justiça portuguesa,

Com minúsculas grafada,

É de classe, com certeza,

E p’la forma dominada.

 

Ninguém respeita a justiça,

Que respeito não merece.

É implacável com os fracos,

Mas aos fortes obedece.

 

A VARA QUE NOS GOVERNA


Foto:FB


A vara que nos governa

Vai desgraçando o país.

Ó meu pobre Portugal,

Como me sinto infeliz!

 

Um caso vai, outro vem,

Nesta desdita sem fim.

Minha terra desgraçada,

Não queiras viver assim.

 

Rejeita a vara e o cajado

E sê livre e exigente.

Um país de sucateiros

É néscio e indigente.
 
in QUADRAS POPULARES- UMAS SIM, OUTRAS QUASE, FOLIO EXEMPLAR, LX., 2011

sexta-feira, 29 de novembro de 2013


PARIS
 

Para  Álvaro Martins,
          (Pároco da Ameixoeira)

Ah, Paris, Paris, Paris!
Uma só palavra
E eis
Subitamente
um mar de emoções
Mitos
E ilusões.

Ah, Paris, Paris, Paris!
Quantas vidas destroçadas?
Quantos desejos por cumprir?
Quantas desilusões?

Ah, Paris, Paris, Paris!
Tanto mistério
e tanto fascínio,
são, certamente,
a explicação,
para este amor,
tão antigo
e tão sincero.

Ah, Paris, Paris, Paris!

MAR DE PÃO

     Trata-se de uma narrativa muito bela do poeta João de Sousa Teixeira. Fala do nascimento, ascensão e declínio de uma UNIDADE COLECTIVA DE PRODUÇÃO, no âmbito da mal-amada REFORMA AGRÁRIA; e onde, em paralelo, é contada uma comovente história de amor, ou seja, a história de Chico Velhaco e Miraldina.
     É um texto que revisito muitas vezes e sempre com enorme prazer.
    Mar de Pão  tem a chancela da "Campo das Letras".

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

QUER CHUVA O BISPO DE BEJA


Quer chuva o bispo de Beja,

Como todos nós, afinal,

Há-de vir e que se veja

Inda antes do Natal.

 

Mas não é com oração

Que a chuva vai regressar.

É precisa a devoção

Que Portas não pode dar.

PEDE AOS SANTOS ASSUNÇÃO


Pede aos santos Assunção

A chuvinha que não vem.

É castigo sem perdão

Que o povo paga também.

 

Chova lá o que chover,

- Ai, é tão grande a desgraça! -

O meu povo vai sofrer

Que esta seca só já passa,

 

Se a pandilha for embora

Para longe do país.

Há-de ir. Vai chegar a hora

Deste povo ser feliz.

segunda-feira, 25 de novembro de 2013


DOMINGOS BROA

 


      Domingos Broa foi meu condiscípulo na escola primária da Mata. Embora os seus pais tivessem uma casa junto à igreja matriz, viviam numa das grandes propriedades da freguesia, onde até as grandes propriedades eram pequenas, e o Domingos fazia a pé, logo pela manhã, alguns quilómetros. Dura vida a deste rapaz, que nunca mais voltei a ver.

     Se lhe quisesse descrever as feições já não seria capaz, porque, no entretanto, passaram-se mais de cinquenta anos. Sei que andava sempre descalço, tendo, por isso mesmo, os pés muito negros e gretados. Surgia na escola sempre a correr, como que a querer imitar o barulho das motorizadas: brrrrrr, brrrrrr, brrrrrr.

     Naquele tempo a televisão passava a série “O Zorro”, um filme de cowboys, que a miudagem gostava de ver. Tinha três personagens principais essa série: o Zorro, que usava uma máscara, o seu fogoso cavalo, cujo nome já esqueci, e um ajudante que era o “Índio”. Desse tempo eram igualmente famosos o “Bonanza” e a “Lassie”. E como não podia deixar de ser, nós tentávamos transpor para a vida real as cenas dos filmes de cowboys da televisão.

     A escola começava às nove horas, mas nós chegávamos a partir das sete e meia, para acabar os trabalhos de casa e para jogar aos cowboys, formando para o efeito binómios, em que um de nós fazia de cavalo e outro de Zorro ou de outra personagem de uma das séries em voga. Com um cordel faziam-se as rédeas, que passavam junto ao pescoço e sob os braços do cavalo e depois era correr. O Cavaleiro segurava as rédeas e empunhava um pau que era a pistola e o cavalo galopava. O cavaleiro dava tiros aos adversários, ouvindo-se então os famosos “pum, pum, pum!”, e a seguir os gritos:” já te matei, já morreste”. O Domingos fazia sempre de cavalo e era certamente o mais fogoso de todos os cavalos.

     A Dona Ester, a professora primária da época, ainda quis tratar dos pés do Domingos Broa. Queria untar-lhos com azeite para que pudesse ser mais fácil remover as crostas. Nunca o terá conseguido. Eu saí antes e nunca mais voltei a ver o Domingos, que, está radicado em França há dezenas de anos. Era filho de Manuel Mateus, Patanisco de alcunha. Domingos Mateus era o verdadeiro nome de Domingos Broa, o cavalo mais fogoso das nossas brincadeiras de infância. Onde quer que esteja, que esteja feliz.

TI TONHO PRATA

 


     Conheci ti Tonho Prata desde a mais tenra meninice. Ainda que situada na rua Nova da Escola, a nossa casa ficava a cento e cinquenta metros, mais metro menos metro, do largo e da tasca mais populares da Mata. E era lá que ia comprar o vinho para Ti João Bernardo e também para o meu pai. E amendoins e castanhas e rebuçados, quando me apanhava com alguns tostões no bolso.

     Era um homem alto – para os padrões da época – e com uma próspera barriguinha. Proprietário com boas fazendas, tinha motorizada e outros meios, que o faziam sobressair de entre os pobres da aldeia. Passava o tempo a aviar os poucos clientes das horas normais do dia e chegava a fechar a porta para tratar dos seus terrenos e das suas árvores. À noite sim, a coisa animava, entre as sete e as dez, quando os homens iam beber o seu meio quartilho ou o seu meio quartilho e depois uns bagacinhos, que davam força e aqueciam o corpo e a alma.
 

     António Balhau era o seu nome e era casado com a ti Maria Antonha, que era mais conhecida por Ti Maria Antonha do Prata, que também servia no estabelecimento que era do casal. Nunca tiveram filhos, mas tinham uma legião de sobrinhos, que não desdenhavam nada de ser herdeiros. Ti Maria Antonha era muito doente. Pobre mulher. Porém, o saudável Ti Tonho Prata acabou por entregar primeiro o corpinho à terra e a alma ao Criador.

     O nosso homem não era muito bom de assoar como se diz na Mata, mas tinha o espaço mais amplo, que foi fazendo evoluir com o tempo. Tinha uma daquelas telefonias grandes, a pilhas, que trazia para o poial, depois da tasca fechada, permitindo à vizinhança ouvir as notícias e aquela música tão ao gosto popular que se fazia nos anos cinquenta. Recordo-me perfeitamente de vir do café de Ti Manel Japona, que já tinha televisão, e ouvir na telefonia do Ti Tonho Prata este anúncio: “Os médicos de todo o mundo recomendam a Binaca / eles lá sabem porquê!”; ou este momento de propaganda: “A verdade é só uma, /rádio Moscovo não fala a verdade”. E foi através da telefonia de Ti Tonho Prata que dei me conta das eleições presidenciais de 1958, que haviam de se realizar no dia antes de eu completar seis anos de idade.

     Tratou-me sempre bem, creio; porém, não era a norma. Corria com a miudagem com um pano de água encharcado, porque entre os putos também havia belas prendas. Mas deixou marcas e até deu o nome ao largo, que, curiosamente, não tem nenhum nome.

sexta-feira, 22 de novembro de 2013


EU SÓ QUERIA

 


Eu só queria, amor,

Voltar a ter aquele rosto antigo

Onde poisava a luz

Dos dias felizes.

 

Aquele rosto sem vincos

E cicatrizes, amor,

E a alegria dos dias

De verão,

Que tão arredia anda

Do meu coração.

 

Eu só queria…

 

quinta-feira, 21 de novembro de 2013


INSTANTES

 

 

Quando o sol –

O grande colorista de Cesário –

Inunda o dia

E os passarinhos

Dão concerto de piano

Nas roseiras

E nos arbustos

Do meu jardim,

Saboreio

Por vezes

A alegria.

 

É então

-Gozando as delícias da preguiça -

Que mais concordo com Adília.

 

O resto,

Obviamente,

É conversa.

 

 

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

O FASCÍNIO DA QUADRA






Os ministros do país

São gente com muita graça.

Zangam-se. Estala o verniz

E a bonomia passa.

 

Não vou gastar mais latim

Com gente que não merece.

É por haver gente assim

Que Portugal empobrece.

 

Que venha Dona Isabel,

A princesa d’ Aragão,

Será boa garantia

Para os pobres terem pão.

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

FALANDO DE GATOS


 D. Pepe
 
Jimmy. Tinha nome inglês o primeiro gato dos meus filhos. Era um rafeiro vistoso, que desaparecia, durante dias, seguindo o cio das gatas. Um dia saiu e não voltou, deixando a casa consternada. Entrou o Fred, um rafeiro com ares de aristocrata. Capado muito cedo, nunca viu gata. Gordo, O Fred é um gato independente, que não aceita pacificamente alterações às rotinas domésticas. Vinga-se, defecando num qualquer lugar da casa. Contudo, é bem tratado e mantém o estatuto de familiar. Ao Fred juntou-se o Pepe, muito parecido com o falecido Jimmy. É um gato meigo e tem grande entendimento. É um gato que até parece gente. Gosta de colo, pastelinho de bacalhau, maçã e iogurte. Exímio caçador, tem inúmeras crises de fígado. Foi companheiro de mestrado da sua dona e madrinha; é mestre, portanto, em cultura portuguesa. E gosta tanto de livros, que corre o risco de um dia vir a ser o bibliotecário cá de casa.

domingo, 17 de novembro de 2013

SETE POEMAS DE AMOR

 



I                                                 

Se tu soubesses, amada,

Quanto dói a solidão…,

E inda o peso destas mãos,

Que não sabem fazer nada!

 

Contigo ausente, esta casa

- Outrora mansão alegre -

É neste preciso momento

O reino da confusão.

 

Rolam rolos de cotão,

Em minha alma tresloucada.

E dói-me o peso das mãos,

Que não sabem fazer nada.

 

Ai, soubesses tu, amada,

Quanto dói a solidão!

 
II

A tua presença, amor,

Mesmo que silenciosa,

Dava-me tanto consolo.

 

A tua ausência fere-me.

As tardes passam tão lentas

E os dias são tão tristes.

 

Amor!, contigo presente,

O passarinho cantava

Num perfeito desatino.

 

Agora tudo é choroso.

Escrevo versos sem graça

e dou-me ao computador.

 

Bebo copos e mais copos

E o passarinho não canta.

Mas não te rales amor…                

                                                        
III




Pergunto por ti às ondas,

Mas as ondas que são ondas,

Não querem saber de ti,

Nem querem saber de mim.

         Virás tarde, virás cedo,

         Quem me poderá dizer?

 

pergunto por ti às ondas,

Aqui junto ao mar, amiga,

Mas as ondas que são ondas,

Não querem saber de ti,

Nem querem saber de mim.

          Virás tarde, virás cedo,

          Quem me poderá dizer?

 
IV

 
O teu sorriso era então

Tão limpo e tão terno, amor.

E nos teus olhos castanhos

Cabiam todos os sonhos.

 

Não tinhas cabelos ruivos

E usavas roupas garridas.

Tua voz tinha a doçura

Das amoras e das tâmaras.

 

Mas o tempo inexorável

Tudo leva e tudo traz…

E cicatrizes nos deixa,

Tantas, no corpo e na alma!

 

Continuemos em frente,

Amor, como sempre fomos!

E amemo-nos com a fúria

Dos engenhosos amantes.

 

V

Tornou-se tão chata, amor,

A vida longe de ti.

A casa é agora um barco

quase, quase a naufragar.

 

Tenho camadas de pó

Como um bibelô vulgar.

E os copos da cristaleira

Já mudaram de lugar.

 

Sinto os sofás na cabeça

E toda a casa a abanar.

Mas não fiques em cuidado,

Que isto vai… há-de passar…

 
VI

Eu queria tanto, amor,

Ter a tua companhia,

O perfume do teu corpo,

A doçura dos teus olhos.

 

Eu queria tanto, amada,

Com teus abraços folgar

E em teu colo penetrar,

Como manda a natureza.

 

Eu queria tanto, amor.

 
VII

Se eu soubesse dedilhar

Como Paco de Lucía

Havia de te encantar

Com momentos de magia.

 

Dia e noite tocaria

E com imensa paixão.

Tivesse eu a fantasia

De uma noite de verão.

 

Pra ti havia de compor,

rica, terna melodia.

Somente por puro amor

Como Paco de Lucía.

 

E tu, decerto, virias

 

 

 

 

 

 

 

FELIZ É O DIA



     ( Homenagem a Al-Mu’tamid)
 

 

Feliz é o dia, ó rosa!,

Em que sinto o suave aroma

Das tuas pétalas brancas.

 

 

Feliz é o dia, ó rosa!,

Em que os meus olhos descansam

Nas tuas pétalas brancas.

 

 

Feliz é o dia, ó rosa!,

Em que toco ternamente

As tuas pétalas brancas.

 

Feliz é o dia , ó rosa!

 

 

 

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

PALAVRAS




Palavras, meu amor,

Só as necessárias,

Para fazer a ponte

Entre o meu e o teu coração.

PERDIDA EURÍDICE


Leight
Perdida Eurídice,

Quero lá saber

Da lira

E da poesia.

 

À maneira antiga,

- A cabeça entre as mãos -,

Vou chorar,

Chorar

E fazer o luto.

 

Depois,

Entregarei o óbolo

A Caronte.