sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

HAIKU

Lindo diospireiro
‘sconde as folhas mostra os frutos.
E o outono vai tão frio.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

DO MEU DIÁRIO


Santa Iria de Azóia, 26 de Dezembro de 2012 – Com alguma regularidade, o Acordo Ortográfico é chamado às páginas dos jornais. É hoje o caso do Correio da Manhã, que traz à actualidade o maior instrumento de divisão entre os utentes da língua portuguesa.

    Este vosso amigo, que já não teme os erros de ortografia, continuará a utilizar a grafia anterior ao acordo assinado em Lisboa em 16 de Dezembro de 1990. Por uma questão de princípio, que radica na convicção pessoal de que estas coisas das línguas, faladas e escritas por muitos povos, não se resolvem por decreto.

     Eu estou convencido de que a língua portuguesa jamais terá condições de unificação, quer pela variedade de povos que a utilizam, quer pelas grandes descontinuidades geográficas dos territórios onde é falada. Felizmente, em vários continentes.

     Poder-se-á argumentar com a globalização, com as novas tecnologias, com a vontade dos Estados, etc. Tudo isto é verdade, mas esta verdade não se pode sobrepor à vontade dos utentes que usam e recriam continuamente esta velha “flor do Lácio”, como lhe chamou Olavo Bilac. Uma das maiores riquezas da língua portuguesa está precisamente nas suas múltiplas variedades. Querer unificar o que não pode ser unificado é mera perda de tempo.

     Esta unicidade poderia ser benéfica para banqueiros e exportadores de alcachofras; porém, nunca o será para os falantes e utilizadores do código escrito. Se os “romanos” não conseguiram unificar a língua de Virgílio, por que razão terá que ser unificada a língua de Camões?

    

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

O FLUIR DO TEMPO


O tempo tudo devora
no seu fluir incessante.
Muda o mundo em cada hora
e a verdade em cada instante.

Vão as horas vão os dias,
vão os meses vão os anos;
Breves são as alegrias,
tantos são os desenganos.

NESTE PAÍS RASTEIRINHO

Neste país rasteirinho,
À beira mar agachado,
Há bom pão e muito vinho
E o porvir sempre adiado.

Há o povo do desenrasca:
Sorna, pastoso, glutão.
Quando pode em tudo casca
Ainda que sem razão.

Não casca no que devia
E queixa-se das lombares.
Muito bem, c... da tia!,
Abaixo todos os muares

PÁTRIA

Os apátridas dos negócios prefiro
Aos lacaios dos apátridas,
Quando os segundos de governantes travestidos,
Impõem o tal respeitinho.

E de ti se riem, alarves e felizes, ó Pátria!

CONVERSA TRIVIAL

    
Contigo luto, quotidianamente, embora saiba perdidas todas as batalhas. Outros mais sábios, e porventura mais ousados, me precederam nesta insana pretensão de querer derramar luz sobre as trevas; mas perseverei sempre, sempre lutarei para que um verso meu inscrito seja no grande memorial que hão-de construir às portas da cidade dos poetas.
     Conversa trivial, bem sei, de simples humano, a quem falta a técnica do lapidador e a ligeireza dos pássaros. Mas lutarei até ao fim, ó distante posteridade, consciente de quão difícil é este combate!

NÃO VENHAS, GEORGES!

     Não venhas, Georges!

     Que este país, Portugal, que outrora foi das naus e das frotas, é de novo a «apagada e vil tristeza» de que falava o Épico, onde só a mentira rende a par com a mesquinhez e a vingança.

     Não venhas, Georges!

     Que este país, Portugal, a minha amada Pátria, é hoje um território ocupado por répteis e outros seres invertebrados, que tudo nos sugam e levam, vorazmente.
    
     Não venhas, Georges!
     

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

A MINHA INFÂNCIA    
 A minha infância decorreu nas saudosas ruas da Mata, térreas até muito tarde - bem mais amplas que o pátio sevilhano de António Machado - e também no quintal da nossa casa, onde meu pai plantou árvores de fruto, nomeadamente, figueiras e laranjeiras.
     Até aos sete anos, também percorri aqueles olivais igualmente saudosos, acompanhando minha mãe e meu pai, ambos assalariados rurais. Meu pai, que aprendera uma profissão, gostava de trabalhar no campo, porque era em estreita comunhão com a terra e com as árvores que melhor se sentia.
     Era um homem divertido meu pai. Gostava de cantar e dançar e rir (ah, mas quando era injustamente contrariado, tínhamos homem para uma valente discussão!). Não havia festa familiar em que não desafiasse as minhas tias para um pezinho de dança.
     Herdei de meu pai, e também de minha mãe, o amor pela terra e pelas árvores. Por isso, todos os dias contemplo as minhas roseiras e o limoeiro e tudo e que planto e semeio no meu jardim.
     Como Machado toda a beleza me seduz e fascina; porém, verifico agora que me mantenho fiel à velha estética de Ronsard, mantendo as rosas nos meus textos.
NÃO TENHO PALAVRAS SÁBIAS

Não tenho palavras sábias nem virtuosas para vos dizer. Se procurais essas palavras, esta não é a melhor porta para bater; porém, a cidade está repleta de homens sábios e virtuosos, que, certamente, vos dirão as palavras que os vossos corações, generosos, tanto procuram.

Eu só sei falar de cigarras, de potros fogosos e bravios e dos dias calmosos do Verão. E se um conselho meu quereis ouvir, pois bem, aqui o tendes: sede ledos como as cigarras, fogosos e bravios como os potros e desfrutai estes calmosos dias de Verão.

Simplesmente, que o tempo – o inexorável tempo –, se há-de encarregar de fazer o resto.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

NATAL

Ó Jesus de Nazaré
- Por quem celebro o Natal -,
Filho de Deus ou José,
És bondade fraternal!

O meu menino Jesus,
Natural da Palestina,
Região de pouca luz,
Onde o ódio germina!

Ó meu eterno menino,
Fonte de eterna alegria,
Douto foste pequenino
Filho da virgem Maria!

Modelo de tolerância,
Fonte de sabedoria:
Deste combate à ganância,
Também à hipocrisia.

Lá na terra Palestina
- Tão mártir, tão castigada! -,
Como Israel não atina
‘starias na intifada!

sábado, 15 de dezembro de 2012

O VERÃO


No verão,
Quando o sol
Incendiava os dias,
Era à sombra
Da figueira branca,
Junto ao poço,
Que a nossa família
Se acolhia.


Pacientemente,
Meu avô
Descascava então
Figos de piteira
Que eu comia.


Saciada a sede
E distribuído o pão,
Muito feliz,
Minha avó dizia:
- Abençoado seja o verão!...

in FRAGMENTÁRIA MENTE, Ed. Alecrim, 2009

O MEU TEMPO É OUTRO
I
E logo hoje,
Que eu precisava tanto de um dia azul,
Alegre e límpido,
(oh, se precisava!)
A Natureza me submerge de cinzento,
Tristeza e bruma.

Que mal te terei feito,
Pergunto-te,
Para me tratares assim,
Ó grande Mãe?!

Porque contrarias,
Tão pertinazmente
Os meus desejos simples
De azul, alegria e limpidez?

Porquê?

Eu aprecio imenso
Eu aprecio imenso
As fotografias geladas
E brumosas
Dos blogues
Da Papu
E do Daniel Abrunheiro.

Porém,
Trago em mim a ansiedade
Das amendoeiras floridas
No fim de Fevereiro.

III
Definitivamente,
O meu tempo é outro:
Abril
Com suas águas mil
 (ó grande António Machado!);
Maio
Com todas as flores;
Junho
Com os primeiros figos
E cerejas maduras.

Definitivamente,
O meu tempo é outro.

in FRAGMENTÁRIA MENTE, Ed. Alecrim, 2009 

NINGUÉM DISSE NADA AO PEREIRA

Biscoitos da casa Gama,
Da pitoresca Ericeira,
Gozam já de tanta fama
E ninguém disse ao Pereira.

Trabalha tanto o Pereira
E não descobre o filão
Dos biscoitos da Ericeira
Óptimos pra exportação.

Alheiras de Mirandela
Podem ir pró Canadá.
Da Beira Baixa a morcela?
No futuro se verá.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012


SÓ EU SEI

Roídos pela saudade
Correm dolentes os dias.
Nesta soturna cidade,
São poucas as alegrias.

Dói-me tanto a tua ausência;
Só eu sei como me dói!
Chego a temer a demência,
Tanto a saudade me rói.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

COMO SE FOSSE ONTEM (NOVA VERSÃO)

     No fim do outono e no inverno, quando o frio apertava, era à volta da braseira que a nossa família se reunia e conversava.
     Na sala exígua, havia duas arcas, onde tudo se guardava e as minhas tias, - ah, eram tão novas ainda! -, se sentavam para namorar sob o olhar atento e severo de minha avó.
   No tecto de madeira, havia maçãs, cachos de uvas, dióspiros e romãs, dependurados, que comíamos com parcimónia e que eram os melhores frutos do mundo.
     Era neste ambiente, que eu ouvia, feliz, as lindas histórias pueris, que meu pai contava.
     Foi há tanto, tanto tempo…
AQUI
     Desta colina onde moro avista-se o Tejo e a grande cidade; porém, na Primavera, eu prefiro andar no olival, por entre as ervas e os arbustos bravios, sorvendo-lhes a fresquidão e os aromas e ignorando o Tejo e a cidade.
     É nessas horas de abandono feliz, que rememoro Cesário Verde e os seus versos alexandrinos.
     E às vezes até parece que a fresquidão e os aromas se propagam também à minha humilde prosa.
    Ou, simplesmente, transparece.




  SEMPRE A CORRER  

 Passei pelos cinquenta, sempre a correr, veloz e inquieto como um pardal. E guardo ainda na cabeça, intactos, todos os sonhos que acalentei nas já distantes adolescência e juventude.
     Algumas artroses insistem em lembrar-me que o rio vai correndo, inexorável, em direção ao mar. De homem vou cumprindo ainda os meus deveres, religiosamente.
     Contigo, Amor, continuo a sonhar quase adolescentemente!...
     Até um dia… Até um dia…


terça-feira, 11 de dezembro de 2012

AS PALAVRAS


I

Ah, as palavras...
- Essas frágeis rosas,
Que sustentam
O meu mágico poder!

Com elas amo
E digo a indizível
Beleza do teu corpo.

Com elas reinvento,
Hora a hora,
A vida e o mundo.


II

Sem as palavras,
Não poderia cantar
A casta flor da laranjeira
Nem as manhãs de verão.

E como poderia cantar
Este país sempre embriagado de sol?


III


Com as palavras tudo faço.
Ás vezes,
Até pinto o céu
Melhor do que os pincéis
De Picasso.


                                                    

PROMETEU

I

Onde estão os meus corcéis?
Tragam-me os meus corcéis,
Que quero rápido cruzar os céus
À procura de um novo sol.


II


Vinde cá,
Meus cavalinhos de oiro,
Vinde cá!
E levai-me a todas as galáxias,
Que quero encontrar
Uma nova luz.


III


Meus cavalinhos de oiro,
Meus fogosos corcéis!
Levai-me,
Levai-me a todos os pontos do universo,
Que quero encontrar
Uma nova fonte de fogo.







segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

A RUA DE SANTO ANTÓNIO

 Era nas águas-furtadas a nossa casa. Era velha e com poucas condições, mas tinha uma claraboia, por onde, quando havia, entrava a luz do sol. Era no número vinte e um da rua de Santo António, quase no coração da cidade. No rés-do-chão, era a mercearia do senhor António Canaveira.
 Em frente, havia uma agência de viagens, onde trabalhava uma rapariga vistosa, com quem, na solidão dos meus pensamentos, fiz as primeiras grandes viagens. Era uma rapariga alegre, que vestia roupas alegres e tinha um sorriso alegre e branco e amplo e um corpo ágil de gazela. Um dia a agência fechou as portas e a rapariga mudou de ares, qual ave de arribação. Se me tivesse pedido, apesar da idade, creio bem que tinha partido com ela. Ah, como batia forte e apressado, naqueles dias, o meu pobre coração!
E o tempo, esse inigualável fazedor, fluía placidamente. Placidamente, que é assim que deverá fluir o tempo. E tudo era normal e rotineiro, até a passagem diário do batalhão, o seis de caçadores, que passava na rua de Santo António ao som do tã…tão…tã-ta-ra-rã dos tambores e do op, dois, erdo, direito dos cabos milicianos.
A nossa casa era nas águas-furtadas do número vinte e um da rua de Santo António e era a foz de um rio de gente que ali vinha pedir um pequeno favor, como visitar, no hospital, um doente ou comer um simples prato de sopa.
Aquelas águas-furtadas eram a casa da gente.

  
Nota: Estes textos, que estou a republicar, Farão parte de NOVOS FRAGMENTOS COM POESIA, a publicar na próxima primavera.

INDIFERENTES AO MEU CANSAÇO

     Agora, indiferentes ao meu cansaço, vêm filhos de mães de moral imaculada, cujos avós e quiçá os pais abancaram à manjedoura do orçamento, donde provavelmente roubaram para dar às filhas e a esses netos, dizer-me que estou a mais; que sou um inqualificável parasita; que não mereço o pão que como.
     A esses bondosos cidadãos, que vão enriquecendo sabe-se lá como e encaixam as crias nos melhores empregos, usando os apelidos dos seus compridos nomes; a esses bondosos cidadãos, que vão fintando as leis para que haja pão e leite e carne e peixe, com abundância, nas suas avantajadas mesas; a esses bondosos cidadãos, que tudo esmifram para aconchegarem mais ainda as suas já farfalhudas contas bancárias; respondo com a veemência do costume: a puta que os pariu!



ESTOU A FICAR CANSADO

     Estou a ficar cansado - não do débito e crédito Rosiano -, mas das alíneas dos números dos artigos das leis e dos decretos-leis, produzidos por juristas preclaros, e também dos números das circulares e dos ofícios-circulados, através dos quais os directores – gerais, debitam para o vulgar o que se deve entender que entenderam, repito, os preclaros juristas.
     Não sou um funcionário triste nem alegre, porque a um funcionário não se pede nem se paga para ser triste ou alegre. Um funcionário é um funcionário, despido de adjectivos, como diria o sempre delicioso Caeiro. Cansado, sim, que a leitura e a exegese das alíneas dos números dos artigos das leis e dos decretos-leis absorvem e ocupam um espaço desmesurado na minha mente.
    Objectivamente, sou um funcionário cansado e estranho que só agora me ocorra este cansaço, quando passei muitas tardes de domingo a olhar o Tejo e os bandos de aves em viagem e eu fui ficando, ficando, ficando e nunca arranjei coragem para mandar às malvas as alíneas dos números dos artigos das leis e dos decretos-leis e ir com as aves.

domingo, 9 de dezembro de 2012

COMO SE FOSSE ONTEM

Eu guardo ainda, intactos, os odores dos frutos, dependurados no tecto da sala da casa de meus avós paternos: maçãs, cachos de uvas, dióspiros e romãs, que comíamos com parcimónia e que eram para nós os melhores frutos do mundo.
    Eu guardo ainda, intactos, os timbres das vozes de todos os entes queridos, que se sentavam à volta da braseira, no centro da pequena sala, juntinhos, nos longos serões do Outono e do Inverno, à luz da candeia.
     Eu guardo ainda, intactas, as histórias pueris que meu pai me contava e que fizeram a minha infância feliz.
     Há tanto, tanto tempo…


HÁ CINQUENTA ANOS



Mata-Rua Nova da Escola

Há cinquenta anos, quando nós ainda éramos todos, eu tinha seis anos e era feliz.
Nunca festejávamos os meus anos. E só sabia que fazia anos, porque a minha mãe me dizia: “hoje fazes anos, filho!” E eu, contente por fazer nos, corria pela rua e anunciava aos rapazes e às raparigas que era o dia dos meus anos.
Nós brincávamos sempre na rua, que era o prolongamento natural das nossas casas, que tinham quase sempre as portas semiabertas ou semicerradas que para o caso tanto faz. Era a rua Nova da Escola, que não tinha ainda estes paralelos ásperos, que continuam a causar-me irritação. A rua era térrea e quando chovia ficava lamacenta e nós brincávamos com a água das poças e por vezes chapinhávamos e sujávamos as saias das raparigas já casadoiras e fugíamos para nos rirmos delas.
E construíamos casinhas, imitando os nossos pais. E nelas mostrávamos o peixe às raparigas e elas nos mostravam o cochicho, sim, peixe e cochicho, que era assim que, puerilmente, chamávamos aos nossos sexos.
Hoje já não somos todos! E os que somos já não nos alegramos com a candura de outrora. Agora, às vezes, fazemos anos para nos dizermos que ainda somos; porém, arredios da simpleza e da alegria de, quando criança, minha mãe me dizia: “hoje fazes anos, filho!” E eu corria pelo interior do sol de Junho a dizer aos rapazes e às raparigas que fazia anos.
Vertiginosamente, a névoa vai tomando conta dos nossos olhos e os nossos corações deixaram, há muito tempo, de rejubilar com o alvorecer dos dias.

(a) – Sim, Pessoa está presente. Pessoa e Caeiro. Porém, foi assim mesmo a minha infância.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

DO MEU DIÁRIO

Lisboa, 28 de Abril de 1994 - Portugal é, nos tempos que passam, um país de proxenetas. Não admira, assim, que volte a perder a oportunidade que lhe foi oferecida com a integração na UE. Nos nossos campos, não florescem mais oliveiras, pessegueiros e laranjeiras do que anteriormente. Os nossos campos foram povoados de jeeps e outras máquinas de quatro rodas, que nunca hão-de produzir um alqueire de trigo, cevada ou aveia. Onde outrora ondulavam searas verdejantes, há agora coutadas quase desertas, para os tecnocratas se libertarem, ao fim-de-semana, do «stress» dos seus quotidianos indiscutivelmente movimentados, mas quantas vezes inúteis.
        A indústria definha, apesar dos muitos milhões de contos que lhe têm sido insuflados para se modernizar. Acontece, todavia, que a desejada modernização passou simplesmente pela aquisição de equipamento informático e não pelo equipamento indispensável ao sector produtivo. Por conseguinte, aumentou o desemprego e diminuiu a produção e a competitividade. Neste sector, se não estou em erro, as grandes maquias foram gastas na aquisição de BMW e na construção de palacetes.
        É este o retrato do meu país. Indiscutivelmente um retrato pessimista, mas verdadeiro. Porque Portugal é um país de bácoros, que sugam vorazmente a teta da UE.

DO MEU DIÁRIO

Santa Iria de Azóia, 5 de Dezembro de 2012 – Pedro Passos Coelho, indiferente ao sofrimento dos portugueses, contenta-se com o contentamento dos alemães e dos credores agiotas. Pois bem, tenho para comigo que um primeiro-ministro, sejam quais forem as circunstâncias, deverá saber ouvir e perscrutar os sentimentos dos seus concidadãos. E agir sempre na defesa dos seus interesses.

     Há quem pense que chamando aos bois pelo nome, nomeadamente aos alemães, se está a desresponsabilizar o executivo de Passos Coelho. Os portugueses sabem até que ponto as políticas seguidas são irresponsáveis e onde começa a responsabilidade de uns e de outros. Coelho sempre quis ir além da “troika”; e esta, mormente o BCU e a CE, têm-se portado mal em relação aos países europeus vítimas dos ataques dos agiotas.

     O FMI, que Portugal também ajudou a fundar, vive um tempo de contradições. Lagarde reconhece o falhanço das terapêuticas prescritas, mas depois vem o etíope SEILÁSEÉ dizer que o tratamento é para continuar. Em que é que ficamos?

     O governo de Coelho e Portas é o responsável primeiro pela desgraça que nos está a acontecer. E a única atitude patriótica é criar as condições para despachar esta gente. Que só chegou ao poder graças à vontade de Cavaco e à teimosia de Sócrates.

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

BORGES

     Passou pelo mundo, excêntrico e atrevido, um argentino a quem os deuses, um dia, negaram a luz. Onde quer que ia, diz-se, inundava os sítios com preciosas pedras, que irradiavam mais luz do que muitos sóis.
     Modestamente, dessas pedras disse que uma só, se boa fosse, lhe daria todo o contentamento que os humanos podem experimentar. Enganou-se! Feitos os necessários testes, os sábios confirmaram que todas aquelas preciosas pedras eram veras fontes de luz.
     Hoje, há uma legião de fiéis que se esforça para ordenar e descrever para todas as línguas do mundo as tais preciosas pedras, que são também sábias e raras.
     Normal não é; porém, às vezes, os humanos vingam-se dos deuses.


 in FRAGMENTOS COM POESIA, Ulmeiro, Lx., 2005








EU SEI

     Eu sei, meu amor, eu sei que esse dia virá.
     E quando vier, quero contigo estar - e com todos os nossos –, para inundar a cidade de cânticos novos. A nossa cidade anda muito soturna. A nossa cidade cansa, entedia, oprime. A nossa cidade está carente de um banho de alegria.
     Eu sei, meu amor, eu sei que esse dia virá.
     E quando vier, quero contigo estar – e com todos os nossos –, para comemorar! Sem constrangimentos, beberemos dos nossos sagrados vinhos até à embriaguez total, desmoronando os diques e deixando que a alegria invada os corações.
     Eu sei, meu amor, eu sei que esse dia virá.
     E quando vier, que não haja drama se eu não estiver. Que outros estarão, certamente, para o receber e comemorar com a simplicidade das crianças.

in FRAGMENTOS COM POESIA, Ulmeiro, Lx., 2005




ARIADNE -I

Ariadne chorou,
Chorou muito sentida,
Quando Teseu,
Sem uma palavra,
A deixou.


Podia ter chorado
O novelo do fio
Ou a espada
Que lhe deu. Não.
Ariadne chorou,
Traída e magoada,
O modo
Como Teseu zarpou:
         Sem uma carícia,
          Sem um gesto,
          Sem uma palavra.



ARIADNE -II


Quisesses tu
- Ó doce filha de Minos! -
Dar-me
Por amor
Um novelo de fio
Igual ao de Teseu...

Desvendados os mistérios
Do meu labirinto,
Num veleiro de sonho,
Sem hesitação,
Levar-te-ia
Onde nos levasse
O coração.

NAS ILHAS DE MALTA

Pensava, mas sem razão,
Que os cavaleiros de Malta
Tinham muita devoção
Nobreza de estirpe alta.

Disse-me o Padre Aguiar,
Homem de muito saber,
Que em Malta vinha lutar
Quem queria enriquecer.

Numa viagem singela,
Com sábia companhia,
Foi-se a lenda e atrás dela
Um mundo de fantasia.

Mas vê-se naquelas ilhas
Tanta beleza e esplendor,
Do Barroco as maravilhas,
Trento em força e com fervor.

in FRAGMENTOS COM POESIA, Ulmeiro, Lx., 2003

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

CIGARRA

Alegre a cigarra canta.
É primavera ou verão.
E com alegria tanta,
Bate f’liz meu coração.

Canta cigarrinha amiga!
Enche a Terra de alegria.
Não sejas como a formiga,
Que trabalha noite e dia.

Indizível alegria,
Que só meu coração sente…
Ah, pudesse esta harmonia
Perdurar eternamente!

in QUADRAS QUASE POPULARES, Ulmeiro, Lx., 2003